HA!

HA!

domingo, 14 de novembro de 2010

Falta de Habilidade

O meu peito
está
comprimido.
E imagino que
seja assim mesmo
que alguém se sinta.
Alguém mais,
não eu.
Comprimida.
Você
desfeito
resmungando (pouco)
.

Eu não sei fazer poesia.
Nem ler poesia eu sei.


domingo, 8 de agosto de 2010

Dadá

A mulher usava meias curtas e coloridas e comia iogurte com uma colherzinha tão pequena que fazia o ato prolongar-se para sempre. Sentava-se numa cadeira grande e confortável, daquelas que giram e a fazia parecer menor do que já era. Todo esse rito (porque, permitam-me alegar, nada mais era do que um ritual mágico de hipnose) fazia com que qualquer um que passasse pela janela daquele cômodo tivesse noção de que entrava num transe profundo. Noção essa que passava com a mesma velocidade que vinha. Ela, então, continuava a falar; tinha pelo menos dois ouvintes-falantes à sua frente. Os demais eram curiosos; pobres insetos grudados à teia da de aranha (no momento disfarçada de peitoril de veneziana com direito a cortina florida).

_Tem cara de bela puta. E não vejo problemas nisso. Problema nenhum, aliás. É como uma aura, sabe, uma espécie de vocação que a pessoa tem. Ela é bonita, muito bonita. Mas não fica bem de modelo. Não sai bem nas fotos, parece achatada. Fotógrafo nenhum consegue fazê-la parecer mais comprida, a postura a denuncia. É uma puta, uma puta das boas, com olhar lânguido. Mas, coitada, é difícil ter que admitir isso, eu acho. E nem pra atriz serve, só de filme pornô e com muito custo. Porque também não é lá muito expressiva. Quando eu digo que tem vocação pra puta, é porque é isso mesmo. Mas acho que vocês não entendem.

terça-feira, 18 de maio de 2010

rasc

Escorregou por uns vinte metros de tubo cor de groselha. Chegou ao fundo batendo com força os pés no chão de espuma. Sentiu aquela dor característica de quem pula e cai de pé, como se o sangue todo ali se concentrasse e, de repente, levasse um empurrão fortíssimo para cima.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

'Como Destruir a Própria Vida' ou 'Durmam, Por Favor'

Hoje o sono chegou. Em sua melhor forma, de mansinho, na ponta dos pés. Foram os melhores vinte minutos da semana. Porque se ele veio no sofá desconfortável e feio da sala, durante o filme de terror que tem insetos gigantes, ele voltará à noite, na caminha confortável e bonita. E não haverão mais carneirinhos a fazer 'MÉÉRR', zombando da menina de olhos um tanto esbugalhados esperando o sol nascer para dormitar por duas horas frias. Não, não, essa noite eles pularão suas cercas e farão 'ZZZZZZZ' ao invés do barulho chato.
O telefone tocou e foi atendido com prazer, apesar da pessoa do outro lado da linha ter estranhado a rouquidão. "É porque eu dormia!"_ E era feliz, devia ter dito.
De repente o cenário muda; encontro-me fazendo uma força que não suporto para segurar algo realmente grande. E pesado. Daí que veio o grito: "SAI DAÍ!".
Saí. Caiu.
_MENINA, SAI DE PERTO QUE PODE EXPLODIR!

Saí mais uma vez. E tudo era desordem e estilhaços. Quebrei a televisão da sala. E não foi um sonho.

sexta-feira, 30 de abril de 2010

De Volta

Me puseram um nariz. Eu me pus um nariz, pra ser sincera. No outro blog, era como se nada me restringisse, podia escrever qualquer coisa, como se respirasse sem nariz, não havia filtro. Aqui fico me contendo, me policiando, só porque não queria que este ficasse igual ao outro. Só que percebi que o que eu quero é o outro.
Dane-se, vou jogar o nariz fora. Digam 'adeus'.

Martha, My Dear

Hold your head up, you silly girl


Andando como quem não tem preocupações_e não as tinha mesmo_, parecia flutuar. Mas só parecia. Se soubesse, assobiaria. Se fosse louca, daria uns pulinhos. Fazia o melhor tempo do mundo: frio ensolarado. E seguia em frente, sem pressa, sem ter onde ir.
Não é estranho ter pessoas na rua às quatro da tarde de sexta-feira. Mas que havia alguém andando perto demais, havia. Ouviam-se sussurros, como se duas pessoas conversassem logo ali atrás.
Olhou. Como quem olha só por olhar, sem demais objetivos.
Uma pessoa só. Homem: alto, cabelo raspado, olhos muito claros e moletom por todo o corpo. Tentou disfarçar, virou o rosto pro lado da rua, mas cara mais suspeita impossível.
Ela teve um pouco de medo, ele tinha um ar diferente. Parecia saído de um manicômio, era isso. Só podia ser. Todo aquele moletom. E as vozes. Como podiam ser mais de uma se ele era um só? E os olhos. Não, não eram normais, não podiam ser. Eram profundos demais, sinceros demais, infantis.
Continuou como se nada tivesse acontecido_e não tinha mesmo. Passava agora por uma escola, um muro tomado pela hera, um portão de madeira, um cachorro adormecido e a sensação de estar sendo seguida.
Olhando em frente enxergava um conhecido. Cotovelos apoiados no muro da casa da próxima esquina, parecia uma namoradeira, daquelas que suspiram por nada, as franjas caindo no rosto. Ele cantarolava. Ela reparou que seu olhar deteve-se na moça_muito bonita_ que agora passava em frente à casa, mas só por um instante; seu olhar focou-se nela.
Foi o suficiente para sentir-se estúpida usando aquela camiseta da vaca. Aquela do 'coma mais salada'. Quis entrar na rua à esquerda, mas seria muita cara-de-pau. E só então notou que aquele que a perseguia já estava léguas à frente, atravessando a avenida pricipal.
Decidiu-se por encarar de novo o rapaz do muro, afinal, se era conhecido, deveria ser cumprimentado. Foi aí que

Take a good look around you
Take a good look and you're bound to see
That you and me were meant to be
For each other, Silly girl


era o som que ouvia. Como já foi dito, ele cantarolava. Estranhamente, ela não o reconheceu. Nem ele a ela. Mas deu uma piscadela.
Merda de sorriso involuntário.

domingo, 25 de abril de 2010

Achado

Quisera eu começar com uma manhã ensolarada, com a grama recém-cortada,refletindo um brilho dourado; margaridas no peitoril das grandes janelas frontais e gisrassóis de quase um metro de altura. Seria quase possível ver os duendes correndo por entre as pedras coloridas do jardim. Mas não. O cacto está na chuva. É de tarde, chove, há lama por todos os lados,o cachorro desapareceu dentro de sua própria casinha e não pretende sair tão cedo. O vizinho da frente permite-se


[Não sei a data exata de quando escrevi isso. Tem mais de dois anos, com certeza. Uns três, talvez. E quando bati o olho, fiquei tentando lembrar quem havia escrito. Até que uma certa tarde me veio à cabeça. Observava o vizinho; a história seria sobre ele. Mas me perdi pelos jardins da vida e acabei desistindo. Só pra constar que meu antigo vizinho morava no terceiro andar e prendia o cachorro no varal do lado fora da janela (ele ficava sentado, preso pela coleira na coisa que as janelas de alumínio têm pra fechar).]

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Monólogo

Eu quero ser um filme, pra prestarem atenção em mim e não ter que repetir o que falo. Porque sempre faço isso: repito. Reparei hoje, observando minha vó falar. E vi que faço igualzinho. Muita gente faz. Fala a mesma coisa várias vezes numa mesma conversa, num mesmo assunto. Pra ter certeza de que o(s) ouvinte(s) não esquecerão aquilo, que a informação não passará despercebida. Repetimos pra formar caráter. Pode ser tudo mentira. Tipo se eu disser 'um dia fui alta' e repetirrepetir até que não o esqueçam.
Num filme, os diálogos são claros. Pelo menos na maioria. Eu diria 'um dia fui alta' e talvez quem conversa comigo nem ouça, mas os que assistem vão ouvir, vão captar minha mensagem. E eu não vou ter que falar duas vezes.

terça-feira, 13 de abril de 2010

Desmazelo

Foi um susto. Vinha treinando tanto nas últimas semanas! Tudo bem, esquecera completamente de fazê-lo desde o fim de semana, mas ainda era terça. Aquilo não era justo.
Acontece que nunca soubera assobiar. E, desde as últimas semanas, conseguir tal proeza se tornara uma de suas obstinações. O treinamento era o mais óbvio possível: lábios curvados até formar-se um círculo; primeiro sugava o ar, depois o soltava. Conseguia progressos. Nos primeiros dias já chiava. Passou por um tempo nisso: acordava chiando.
Depois veio um resfriado que dificultou um pouco as coisas, mas na semana seguinte já estava a fazer o barulinho outra vez. E a cada dia ele aumentava. Sentia-se orgulhosa. Até aquele fim de semana.
Não tivesse mudado os planos e aquilo não aconteceria. Nunca mais tentaria surpreender alguém de novo, porque quem sempre saía surpreendida era ela. Saiu na sexta, surpreendeu-se, afogou-se em tudo o que estava ao alcance para para fazê-la dormir. Dormiu. Acordou no domingo, os pais já preocupados.
E só agora, na terça à tardinha que se lembrou de continuar com os treinos de assovio. Mas o ar não queria entrar. Tampouco sair. Nada adiantava, nunca assobiaria. Não estava mais apaixonada.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

1/12/2008

Em seu lugar


Sente-se no sofá. Pode falar o que quiser. Eu não sou analista, não sou psiquiatra, nem psicólogo. Só estou aqui pra ouvir, porque me interessa a tragédia alheia. Queria ter essa capacidade, a da tragédia. Desde sempre que fui assim, sem graça e isso até poderia ter dado uma boa tragédia, mas não deu. E agora cá estou, a caçar pela de outrem. Vou bebendo cada palavra, como se cada gole me tirasse a própria vida. E a cada ausência de vida que sinto, aumenta a minha necessidade de preenchê-la de vida nova, que busco em você mesmo, minha vítima. Soa clichê, mas sou um vampiro de sentimentos.
Falo pouco, o que falei até agora foi na intenção de explicar-me. Não que eu espere que me entenda, mas seria falta de educação se não me apresentasse. Quanto a você, não gaste energias. Sei tudo sobre sua vida, desde o livro favorito até o fato de não apreciar o ato da leitura. O que, particularmente, acredito ser um desperdício; uma mente brilhante necessita ser polida regularmente e nada melhor que um livro para fazê-lo. Mas perdoe-me a reflexão em hora imprópria.
Antes que comece, quero fazer apenas mais uma observação. Tente não chorar. Não suporto criaturas que se descabelam por seus próprios motivos. É egoísta, meu amigo. E não vou desculpar-me por ser grosseiro ao proferir estas palavras, ou se, por um acaso, ofendi a sua opinião. Falo apenas verdades e estas não devem ser castigadas ou silenciadas. As verdades são absolutas. Chego a enojar-me só de pensar em quão frívolos pensamentos terei de escutar por hoje. Preciso de ar, vou até a janela. Pensando bem, acho que vou mudar de rotina por agora. Adeus, não agüento mais o seu silêncio carregado de palavras e significâncias.

E foi. Pulou. Mas não caiu. Abriu os braços e como estes funcionassem como um perfeito par de asas, saiu voando em direção ao sol do meio-dia.
A pessoa no sofá se levanta, vai até a janela e o acompanha com o olhar. Espia o relógio. Ainda é cedo, mas decide ir almoçar. Merecia uma folga antes do próximo cliente da análise.



(2008 é meu ano preferido, foi meu ano mais feliz. Terminou em tragédia, mas enfim, acontece. Seguindo uma lógica otimista, 2010 também deveria ser um ano feliz, porque 2007=fail, 2008=feliz, 2009=fail, no entanto, não vou me iludir (mais).

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Só pra passar o tempo

Só pra passar o tempo ela esperou a água ferver. Sim, é o cúmulo da falta do que fazer, mas como realmente não havia nada melhor, foi o que fez. E, no começo, quando haviam só bolhinhas, sentiu uma pontada. Sorriu para as pequenas formações do ar no meio da água e esperou ansiosamente. Agora elas cresciam e estouravam e a euforia ia tomando conta dela aos poucos, pelos cabelos, nariz, dedos e quando não se sabia mais o que era bolha e o que era água, ouviu-se um estalo na cozinha. E em instantes não havia nada ali além da chaleira. Ferveu.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Um tiro no fígado

Um tiro no fígado e que que a gente faz com a cerveja que sobra no refrigerador?
Que que a gente faz com quem fala 'refrigerador'. O nome é geladeira e parece bem mais útil.
O tal refrigerador não serve pra nada, a não ser nos dias de verão em que faz tanto calor que dói e então se enfia a cabeça lá dentro (do refrigerador, claro).

Mas não era bem isso que queria dizer. Era algo sobre vidro inflável. E que quem entrasse na cozinha veria uma obra de arte feita pelo Acaso, o mais ilustre artista de todos os tempos. O prato quebrado sobre a fruta esmagada. Agora eram uma coisa só; não eram cacos melecados de frutadoconde nem uma fruta do conde aberta e chapinhada de vidro.
E o barulho da porta arrastando tudo pelo chão.



Não me deixem entregue à sinestesia que viro cor.